
Pesquisador político, Wahdat-Hagh trabalha para a Fundação Europeia para a Democracia em Bruxelas e investiga o islamismo no mundo desde 2005.
–Quando o embaixador do Irã no Vaticano, Akbat Naseri, apresentou suas credenciais, Bento XVI advertiu que o país deveria respeitar o direito dos cristãos à liberdade religiosa. Qual é o estatuto legal dos cristãos no Irã?
–Wahdat-Hagh: Temos de distinguir entre
os cristãos étnicos tradicionais do Irã e os novos movimentos cristãos
que vieram para o país. As Igrejas armênia e assíria mais ou menos se
adaptaram, apesar de que seus membros não podem viver da forma que
escolheram. Seus membros sofrem discriminação sistemática nas áreas da
educação e trabalho. As mulheres devem por lei usar o véu. Os cristãos
e membros de outras religiões reconhecidas, tais como judaísmo e
zoroastrismo, são considerados "dhimmis". Os dhimmis são de fato
cidadãos de segunda classe e não têm os mesmos direitos que os xiitas.
Ademais, os cristãos são considerados "kafar", ou pagãos. Só os que
aceitam o Alcorão como última revelação de Deus são crentes. Os pagãos
são considerados “impuros”.
–Que sucede com as minorias que não têm o status de "dhimmi"?
–Wahdat-Hagh:
Entre elas inclui-se os bahais, que são ilegais. A vida de um cristão
segundo a lei iraniana vale menos que a de um muçulmano, como se pode
observar nos pagamentos de compensação por um acidente de trânsito. A
própria legislação considera a vida de um bahai como absolutamente sem
valor, devido à crença bahai em uma revelação de Deus que apareceu
depois da vida de Maomé. Além disso, os bahai creem na igualdade dos
sexos e no mandamento de promover a paz mundial. Também rejeitam
totalmente a violência política. Estes são temas tabu no Islã
totalitário fundamentalista e a doutrina estatal iraniana é um reflexo
disso.
–O Papa também aludiu à longa tradição do catolicismo
no Irã. Há diferenças no modo em que as restrições da liberdade
religiosa afetam as diferentes igrejas cristãs?
–Wahdat-Hagh:
Os iranianos que vivem de verdade perigosamente são aqueles que se
converteram ao cristianismo recentemente e se uniram ao sempre
crescente movimento "Home Church". Algumas fontes indicam que estas
igrejas domésticas se tornaram mais fortes que a Igreja Católica no
Irã. Os convertidos são vistos como apóstatas e correm o risco de
execução. No Islã não se permite a um muçulmano se converter a outra
religião: implica a pena de morte. Uma nova lei de apostasia será
aprovada antes do fim do ano. A vida de centenas de milhares de pessoas
está em perigo.
–O Papa disse que a liberdade de fé, consciência e credo são a fonte de todas as demais liberdades. Que significa isso especificamente para o Irã?
–Wahdat-Hagh:
O que o Papa disse é verdade e é ainda um grande problema no Islã. Os
muçulmanos liberais dizem que não há compulsão no Islã, mas, segundo a
lei, nenhum muçulmanos pode deixar a fé islâmica porque o Alcorão é
considerado a última palavra de Deus. Para o Irã, isso significa que
não há liberdade de fé ou consciência, e por consequinte todas as
outras liberdades são inexistentes. Portanto, não pode haver direitos
da mulher na República Islâmica, assim como não há liberdade de
imprensa, e se tolhe também o direito de congregar-se e forma
associações. Mas sobretudo não se concede o direito à vida aos
apóstatas. A existência da liberdade de fé, consciência e credo foi
proibida no Irã desde o momento em que tudo se baseia na lei islâmica.
–Muitos observadores associam as maiores violações dos direitos humanos com o regime do presidente Mahmoud Admadinejad. Como outros gerenciariam o direito à liberdade religiosa?
–Wahdat-Hagh: Quando
Mousavi foi primeiro ministro, nos anos 80, toda a oposição secular foi
absolutamente eliminada. Então costumava advertir contra a cooperação
com os Estados Unidos e a Europa. O movimento para a reforma social e a
liberdade que agora Mousavi usa como um escudo se radicalizou. Hoje
Mousavi segue citando a autoridade do totalitário ideólogo e líder
revolucionário aiatolá Jomeini. Alguns dizem que ele mudou. O futuro
revelará se dará marcha ré à ditadura totalitária da República
Islâmica.
–O Papa também fala da cooperação internacional desde uma visão para alcançar a paz global. Que teria de acontecer para que o Irã aceitasse de modo crível este convite?
–Wahdat-Hagh:
A questão é o que o Irã deve fazer para tornar possível a cooperação
internacional para a paz global. Não é suficiente para ideólogos como
Jatami falar do diálogo de civilizações. O Irã tem de superar a
ideologia totalitária do jomeinismo e conceder liberdades elementares a
seus cidadãos. Um Irã democrático pode também trabalhar de modo crível
pela paz global. A sociedade civil iraniana tem potencial para isso.