Postado em: 27/02/21 às 18:44:10 por: James
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Apresentada como proteção contra conversões forçadas, a lei pode ser instrumentalizada para perseguir minorias, sobretudo cristãos
Lei restringe conversões religiosas no Estado mais populoso da Índia, Uttar Pradesh, que, sozinho, tem 204 milhões de habitantes – próximo da soma de todos os 26 Estados brasileiros e o Distrito Federal.
Essa enorme população, desde este dia 24 de fevereiro, é obrigada a contar com sólidos argumentos para justificar a sua eventual mudança de crença, já que o legislativo estadual aprovou o Projeto de Lei de Proibição da Conversão Religiosa.
Segundo a agência Fides, a nova lei determina que ninguém se converta “direta ou indiretamente de uma religião para outra por meio do uso ou prática de deturpação, pela força, influência indevida, coerção, incitamento ou persuasão ou por qualquer meio fraudulento, ou ainda por casamento”. De fato, o casamento será “nulo e sem efeito” caso a conversão religiosa aconteça exclusivamente para essa finalidade. Já quem quiser mudar de religião depois do casamento precisará de autorização do juiz distrital.
Quem violar a nova lei poderá ser multado e inclusive condenado a até 10 anos de prisão. Além disso, quem for acusado de induzir alguém a se converter, ou mesmo quem tiver se convertido, terá o ônus de provar que a conversão não foi imposta por meios ilícitos.
À primeira vista, parece uma lei que protege as pessoas…
Em tese, esta peculiar legislação teria o objetivo oficial de impedir conversões forçadas, especialmente de mulheres hindus que se casam com adeptos de outras religiões. Yogi Adityanath, governador de Uttar Pradesh e membro do partido nacionalista hindu Bharatiya Janata, declarou explicitamente que a medida visa dificultar tentativas de converter mulheres hindus ao islamismo.
A nova lei prevê, por exemplo, que a vítima de uma conversão forçada, bem como seus pais ou parentes, podem denunciar o fato à polícia e solicitar uma investigação. Por isso, a legislação é apresentada como protetora da população contra opressões à liberdade religiosa.
…mas o efeito pode ser o contrário
No entanto, ela facilita o efeito contrário, já que, mediante manipulações e interpretações subjetivas dessa legislação, qualquer membro de uma minoria religiosa pode ser acusado de tentar persuadir outros cidadãos indianos a se converterem à sua crença.
Dom Joseph Pamplany, bispo que faz parte da Comissão de Doutrina da Conferência dos Bispos Católicos da Índia, observou:
“A lei vai contra o espírito da constituição indiana, que garante aos cidadãos o direito de professar, proclamar e pregar livremente qualquer religião, escolhendo-a de acordo com a sua consciência. Sob o pretexto de impedir a conversão pela força, [a nova lei] visa as minorias religiosas, especialmente os cristãos e os muçulmanos”.
De fato, várias organizações de defesa dos direitos humanos, assim como líderes religiosos de diversas denominações, se disseram preocupados com o aumento de Estados indianos que vêm aprovando “leis anticonversão”, instrumentalizáveis para intimidar minorias religiosas e missionários, em particular os cristãos.
O caso das leis antiblasfêmia do Paquistão
A intervenção política na liberdade religiosa é cronicamente dramática em um país vizinho da Índia: no Paquistão, existem as assim chamadas “leis antiblasfêmia”, que proíbem quaisquer irreverências contra o islã. É frequente que essa legislação seja manipulada para perseguir minorias religiosas.
Um dos episódios de maior repercussão mundial relacionados com essas leis foi o da católica Asia Bibi, esposa e mãe de cinco filhos, que chegou a ser condenada ao enforcamento por ter supostamente ofendido Maomé. Ela foi acusada por vizinhas, sem provas. Após quase 10 anos entre o presídio e o corredor da morte, ela teve a sua sentença capital cancelada graças à incansável pressão organizada por grupos locais e internacionais de defesa dos cristãos perseguidos no mundo.